sábado, 25 de setembro de 2010

No Escuro

Alguns dias atrás foi meu aniversário, confesso que o mês de setembro é sempre um mês um pouco depressivo pra mim, não apenas por ter nascido nesse mês, mas porque é quando paro pra analisar as minhas realizações, minhas lutas, e as batalhas que ainda terei que disputar. Este ano ganhei um presente que foi maior do que todos os presentes que poderia receber. Um presente cujo valor excede todas as cifras existentes no mundo, e como diz meu pequeno príncipe, é infinita. Mas isso vou contar em outro post onde falarei sobre o perdão, sobre o ser humano. Agora quero falar sobre o peso dos anos.

A minha curta experiência de vida me mostrou algumas pérolas que talvez eu compartilhe com vocês; gosto de dizer que quando temos uma decisão importante pra tomar e estamos confusos sobre a melhor opção, o melhor é não optar por nada. Quando concentramos nossa energia num único problema, muitas vezes deixamos passar detalhes importantes, e passamos a vida toda nos perguntando se a escolha que fizemos foi correta.

Na época da faculdade uma professora de psicologia do desenvolvimento explicou o que era “insight”, e fiquei pensando que, quem sabe, esse tal de "insight" não seria a resposta para os nossos problemas. Quando deixamos de lado uma decisão importante para cuidarmos de outros assuntos, é bem comum encontramos a resposta para a questão que nos afligia. A conclusão é que não fazer nada é a decisão mais importante num momento difícil. Longe de dizer pra nos prostrarmos diante das coisas, digo que se pudermos esperar, o tempo nos mostra o que realmente queremos fazer. E enquanto isso cuidamos de outros assuntos.

Essa semana topei com um estudo de uma indiana que provou cientificamente, o que antes eu deduzia empiricamente. De maneira que, ontem, deixando meus problemas de lado, resolvi reviver uma experiência que remontava meus tempos de adolescente. Peguei o metrô meio sem rumo, meio sem obrigação e fui para onde meu coração me mandou. Tudo bem que isso não corresponde exatamente ao que descrevi, mas ontem me propus a viver experiências novas e antigas, únicas e fantásticas.

Quando criança, os adultos sempre nos falavam que éramos muito pequenos pra muitas coisas que queríamos fazer. Lembro que desejava fazer 18 anos para realizar tudo que antes me era proibido. Só que ninguém nos conta que junto com a tão sonhada palavra liberdade vem um plus, não muito legal, chamado responsabilidade. Tem horas em que me canso de decidir tudo, de tomar iniciativa, de fazer sempre o que é certo e de viver sempre no meu mundinho. Ontem eu me despi de mim, e entrei fundo no vazio do que sou, respondendo a um eu renegado.

Quase não dormi, mas foi um dos dias mais felizes desse ano. Sair por aí sem preocupação e sem obrigação, conhecendo pessoas por onde passava, me sentindo viva e jovem, sensual e bela. Não foi preciso aprofundar relações, nem falar sobre temas fechados, simplesmente conversei com diversas pessoas, sobre assuntos diferentes e me dei conta da minha insignificância e de como muitas vezes sou prepotente e arrogante. Porque nem tudo que é ruim pra mim é ruim pra todos. Percebi isso conversando no metrô com uma menina que estava satisfeitíssima com o prefeito que eu não suporto. Nós estávamos certas nas nossas opiniões, e estávamos erradas. Cada uma olhava apenas pra sua própria necessidade.

No fim, sinto que fechei um ciclo e respondi a uma questão que me deixava angustiada. Mas principalmente, consegui resgatar o melhor de mim. Adoro pessoas e as odeio. Acho que o princípio universal da vida é a ambigüidade. Estudando um pouco de mitologia percebi que todas trabalham, de uma maneira ou de outra, a questão da ambigüidade. Veja o Yin e Yang, fêmea e macho, bem e mal. Isso pode ser visto em todas as culturas, desde as mais antigas até o presente momento. Quem não se pergunta se é bom ou ruim. Quando olhamos aquele doce ou salgado atraente e apetitoso, sempre nos perguntamos se nos fará bem, mas quando o saboreamos sentimos que nos faz bem, e não importa se aumentou nosso peso, colesterol ou pressão. Pra nós o prazer esta sempre associado a algo bom. Será?

Segundo Foucault, a sociedade para manter a “ordem” e a “disciplina” nos restringe o prazer. Assim, vemos na cultura judaico-cristã o sexo como sendo algo ruim, um mal necessário para manutenção da espécie. Não são poucas as mulheres que, mesmo com o desenvolvimento do movimento feminista e a liberação sexual do nosso século, jamais foi capaz de sentir prazer, de ter um orgasmo.

Em algumas culturas, o prazer só é permitido para os homens. Em muitos países da África o clitóris feminino é extirpado ainda na infância a sangue frio, levando muitas a morte prematura e outras à ignorância total do prazer sexual (pelo menos o clitoriano). Mas quantas de nós, nas sociedades dita liberais, não temos nosso clitóris extirpado? Nosso prazer negado?

No trabalho, somos vistas de modo diferente. Se um homem anda com um botão da blusa aberto, ele é visto como sendo descolado, se uma mulher faz o mesmo é considerada, no mínimo, como sendo muito ousada, atrevida ou indiscreta. Não estou tratando de uma questão puramente sexista, porque as mulheres, por vezes, são as primeiras a se criticar.

Vi um belo filme chamado Malena, um interessante filme que retrata o descobrimento do sexo por um menino e o preconceito de uma pequena vila com uma mulher jovem, bonita e solitária. Malena, casada com um militar, é deixada duas semanas após seu casamento para que seu marido lute pela Itália na Segunda Grande Guerra.

O incomodo causado pela beleza da jovem e sua solidão, faz surgir vários boatos sobre sua fidelidade ao marido distante. Assim ela ganha a antipatia das mulheres, invejosas de sua beleza e jovialidade, e o desejo ardente dos homens, intrigados e desejosos. Até então, os boatos não lhe causavam muitos problemas, mas quando seu marido é dado como morto, a cidade se alvoroça, e tais boatos chegam até o pai da jovem que, crendo na má conduta da filha, a abandona. Viúva e após a morte de seu pai num bombardeio a cidade, Malena se entrega aos boatos e se torna uma prostituta.

Não vou contar o final do filme, pois acredito que pela bela fotografia e delicadeza da história, ele deve ser visto e não simplesmente contado. A sutileza com que são mostradas as cenas e o desenrolar da história me faz pensar o quanto, ainda hoje, não nos deparamos com Malenas e mulheres invejosas, assim como homem recalcados.

Você me pergunta como do meu aniversário eu fui parar na questão da liberdade sexual e o preconceito?

Pois bem, quando adultos nos deparamos com várias teorias, teses e antíteses da vida. Neste momento penso que todo radicalismo excede a razão e a destrói; desejo, profundamente, que nos próximos anos o mundo seja mais racional e humano.

“Quando tá escuro e ninguém me vê

Quando tá escuro, eu enxergo melhor

Quando ta escuro, te vejo brilhar

É onde eu fico a vontade sem medo da claridade

Passo o dia inteiro esperando a noite chegar

Porque não há mais nada que eu queira fazer.

Quando tá escuro, tanto faz que cor tem

Quando tá escuro só valem as palavras

Quando tá escuro ninguém repara as minhas meias

É onde eu fico a vontade, sem medo da claridade

Passo o dia inteiro esperando a noite chegar

Porque não há mais nada que eu queira fazer...”

(Pitty – No escuro)

A tempo: Por que nos sentimos idiotas quando estamos absurdamente felizes?

Nenhum comentário:

Postar um comentário