terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Essa tal de Melancolia

          Nos últimos 16 anos, no Brasil, cresceram o advento das redes sociais. Há uma reclamação constante de alguns sobre a falsidade do que é mostrado nas redes sociais. Há quem questione o mar de rosas exposto e que, muitas vezes, não condiz com a vida real. E queria pensar um pouco sobre alguns pontos dessas reclamações.
          Em primeiro lugar, nossa sociedade prega que a felicidade é o bem maior. E devemos nos sacrificar em prol da felicidade. Seja ela pessoal ou do outro. Então é comum a ideia de que devemos lutar para conquistar algo que nos deixe felizes. Seja um emprego dos sonhos, o amor de uma pessoa que desejamos, seja qualquer outra coisa que possa trazer algum felizes para sempre. O problema é que o felizes pra sempre não existe. Só que não tem como sermos felizes o tempo todo. E, muitas vezes, é nos momentos de tristeza que nos tornamos mais produtivos.
          A melancolia nos causa dor. Quando temos uma dor no corpo, buscamos formas de parar a dor. Tomamos um analgésico. Quando temos uma dor na "alma", precisamos criar estratégias para nos livrar dessa dor. Algumas vezes, abusamos de remédios e do uso dessas estratégias, gerando compulsões. No entanto, não vamos nos aprofundar nisso. A dor da alma chamamos de melancolia. Ela pode ser eventual ou pode ser constante. Quando se torna constante, indica uma doença ainda mal entendida e mal vista - a depressão.
          Em segundo lugar, não somos ensinados a lidar com nossos sentimentos. Nem os bons e nem os ruins. Eu, por exemplo, tenho uma dificuldade enorme em lidar com elogios, porque se aceitamos, acham que somos metidos. Mas se contestamos, estamos usando de falsa modéstia. Fica difícil entender as regras sociais para cada situação. E se sentimentos bons são confusos, os ruins são execrados de tal forma que sentimos vergonha até em falar seus nomes. O sentimento de ódio, por exemplo, é muito criticado. É como se ele não devesse existir, mas existe e precisamos aprender a lidar com ele também. Talvez se fossemos ensinados a lidar com nossos sentimentos, sejam bons ou ruins, teríamos menos violência e mais empatia.
          Em terceiro lugar, A vida virtual não é diferente da real. Ninguém costuma sair na rua com aquela roupa velha que usa em casa pra fazer faxina ou dormir. Todos se enfeitam de alguma forma pra se mostrar a sociedade. 

sexta-feira, 10 de janeiro de 2020

Eros e Afrodite ou a confusão dos amantes

          Na mitologia grega Eros e Afrodite representam o erotismo, a sensualidade e o amor. Tenho pensado muito sobre o motivo de buscarmos esse tipo de conexão com o outro. Uma conexão que não precisa, necessariamente, ser física. Mas precisa, obrigatoriamente, ser recíproca. Ainda que essa reciprocidade não seja o desejado. Precisa haver um elo. E é nessas possibilidades que nossos corpos e mentes se perdem nos desejos. 
          Não entendi? Dirá meu caro leitor. No que eu responderei - contrariando a ideia de Kant de que o exemplo é encarcerador da ideia, darei exemplos. Alguém pode se apaixonar e não ser correspondido com a mesma paixão, mas com uma amizade. O apaixonado nunca terá o gozo do prazer carnal, mas terá alguma forma de carinho de quem nutre o desejo. Desejo é coisa estranha e pode ser transformado em outras coisas. Ou mesmo podemos mudar o foco do desejo. 
          Se a pessoa que é desejada não deseja, sempre há quem deseje. E a oportunidade de sublimação do desejo pode ser revertida pra essa 3a pessoa. Assim, a amizade pode prosseguir e o apaixonado não precisa se frustrar. Terá obtido o desejo, mesmo que com outra pessoa. Não sei até que ponto isso traz a tal sublimação do desejo não correspondido. Mas é aquele velho dito: Se cura um amor com outro amor. - Mas eu diria, na falta de um amor romântico, podemos focar apenas no sexo. 😳
          Não sei dizer se funciona ou não. Apenas estou refletindo. As relações humanas ficam em dois hemisférios - o real e o imaginário - na falta do real, o imaginário pode transcender e saciar a pessoa. Mas será que ocorre a saciação plena do desejo? Talvez sim, talvez não. Mas fico pensando se esse monte de desejos não saciados não acabam se transformando em compulsões. Somos energia. E como energia precisamos de trocas constantes. 
          Na época da faculdade, estudei um pouco de bioenergética. Sobre como podemos trabalhar de outras formas essa energia produzida pelo nosso corpo. E como nos manter saudáveis mental e fisicamente através dessa dissolução de energias acumuladas. Já vi que vc quer saber qual a fórmula mágica! Mas não tem. Muitas vezes, essa energia acumulada se torna frustrações e amarguras. Como seres conscientes, precisamos identificar esses desejos e identificar formas de sublimá-los. De libertar nosso corpo dessa energia acumulada. Alguns encontram a saciação na dança, na corrida, no trabalho... mas devemos tomar cuidado pra não abusarmos. a saciação dos desejos na forma como eles veem é importante também. Apenas quando não for possível, precisamos sublimar. 

Ainda sinto na boca o beijo
O corpo colado junto ao meu
O toque dos dedos deslizando pela minha pele
A sensação de não ser mais apenas eu
Mesmo uma única vez
Ainda lembro do encontro
Aquele conto encantado fruto do desejo
Fruto daquilo que nunca sonhamos
Apenas uma vez
O medo do novo, daquilo que não sabemos
O distante conto de Eros em nossas mentes
A entrega, mesmo que mediada por Baco
A espera que fora tão grande
E no que o mundo parou um instante
Demos vazão ao desejo reinante
Não fora tudo, sobrara um pouco
Um sabor de que faltou algo
Baco sempre atrapalha um pouco
E na onda das incertezas
Essa triste indefinição
O desejo não murcha
Não sublima
Não sucumbe ao ato em si
Ele cresce e reina perene
Naquilo que ainda não existe
Supreendo com sua imagem presente
O corpo ausente parece estar aqui
Eu sinto na ânsia dos sonhos
Que nada será igual
Mas eu quero que seja o desejo
Sem medo, sem receios
Apenas dois corpos em um.

terça-feira, 7 de janeiro de 2020

Despedidas


          Se existe algo que amedronta a maior parte dos seres humanos é a morte. Pois ela significa a impossibilidade de mudança. Se temos medo de mudar, temos ainda mais medo daquilo que é imutável. A mudança nos traz o novo, o inesperado, aquilo que não temos controle. E o ser humano teme tudo aquilo que não pode controlar. Nesse ponto a morte se torna algo sobre o qual não temos controle. E por mais que a medicina tenha evoluído, ainda não conseguiu alterar esse fato - a morte é democrática, ninguém pode fugir dela.

          Mary Shelly escreveu um romance onde tentava lidar com seus sentimentos acerca da morte de sua filha. No livro ela tenta lidar controlar a morte, mas descobre que esse controle não é possível. Podemos conjecturar que a revolta da criatura pode simbolizar a nossa dor. A dor de quem teve os seus sonhos destruídos. A dor de quem não concluiu suas projeções ou desejos. A dor do eterno. Se a vida nos traz diversas possibilidades, a morte nos tira todas elas. Quem morre deixa um legado de sentimentos que nem sempre são bons. Quem fica pode sentir que há uma ponta solta. Algo ainda não terminado.

          O luto é sempre doloroso. E não há regras pra ele. Há um tempo certo para seu início, mas não para o fim. A dor não é constante, mas crônica. Tem vezes que é mais difícil lidar com ela, e tem outros momentos que é mais fácil. Mas não tem fim. Também não existe regras pra lidarmos com o luto. Talvez possamos estabelecer metas. Precisamos aprender a lidar com a perda. Trabalhar o desapego e lembrar que não importa o que não podemos mudar, mas podemos manter vivas as memórias e os bons sentimentos que nutrimos e das relações que vivemos.

          Sei que não fui clara e acredito que há uma música do Renato Russo chamada Ventos no litoral que pode ser melhor explicativa. Na música ele diz: "lembra que o plano era ficarmos bem". Precisamos nos lembrar sempre que o amor e o que foi criado da nossa relação com quem partiu era mais importante do que as projeções de um futuro com essa pessoa. Precisamos lembrar que ninguém é responsável pelas projeções que fazemos. Logo, não podemos despejar toda a nossa energia em quem não tem como recebê-la. Isso vale pra quem morreu e pra pessoas que nos deixam, mas permanecem vivas. Ninguém é responsável pelos nossos desejos ou projeções. E se somos responsáveis pelo que sentimos, precisamos cuidar de nossos sentimentos e pensamentos como cuidamos de nos alimentar ao sentirmos fome.